sábado, 7 de março de 2020

103 ANOS DE BACABAL, PARABÉNS!

103 ANOS DE BACABAL, PARABÉNS!
Por: Raimundo Flor Monteiro

      Marco situacional de Bacabal
   A cidade de Bacabal é um município situado na macrorregião do Leste Maranhense com área estimada em 1.609 km2. Após passar por vários desmembramentos históricos nos últimos anos a cidade passou a limita-se com os municípios de Vitória do Mearim, Lago Verde, São Luís Gonzaga, Lago do Junco, Coroatá, São Mateus do Maranhão, Olho D’Água da Cunhãs e Pio XII. 
      Situação climática
    O clima é quente, úmido, com temperaturas quase constantes com máximas de 35° e mínimas de 30°C. O período normal de chuvas prolonga-se de janeiro a junho. 
     Posição geográfica
   É na mesorregião do leste maranhense e na microrregião do Médio Mearim que o município de Bacabal está situado. Seu território está quase todo localizado na área denominada “Superfície Maranhense de Testemunhos”, com o relevo correspondendo a uma superfície modelada em rochas cretáceas com alguns testemunhos tabulares. Detentor de uma área de 1.444  quilometro quadrados, a sede municipal localiza-se nas coordenadas geográficas de 4 graus, 14 minutos e 12 segundos de latitude sul e longitude de 44 graus, 43 minutos e 50 segundos a oeste de meridiano de Greenwich a uma altitude de 38 metros. A cobertura vegetal primitiva predominante era do tipo floresta estacional perenifólios com babaçu e campo brejoso. 
     O topônimo "Bacabal"
   Originou-se da extensa vegetação que cobria abundantemente sua extensão de terras. Ou seja, de plantas denominadas de "bacabeiras" – uma espécie de palmeira - existentes na localidade, quando de sua fundação em uma dinâmica Vila.
    Hoje, a palmeira que deu o nome à cidade está praticamente extinta devido ao extrativismo, enquanto os campos foram tomados pela rizicultura. 
    Entre os principais acidentes geográficos, o principal é o "Rio Mearim" que, atingindo o município pela parte sul na localidade de lugar Vila Velha, alcançando o norte em Lage do Curral, prosseguindo até o limite com Vitória do Mearim. 
    O Rio Mearim, em função das estradas federais e estaduais, perdeu a condição de prioritário quanto a navegação. Contudo, ainda preserva a condição de navegável e bastante piscoso. Ele foi, até o advento das rodovias, o único veículo natural de comunicação do município. Não obstante, há também o igarapé Ipixuna, piscoso, que penetra na parte sul do Município, atravessa a rodovia BR-316 e deságua no Mearim, com o nome de Ipixuna Açu.
    Quanto ao limites, a cidade tem Olho D'água das Cunhãs, Lago Verde e São Mateus ao Norte; Ao Sul São Luís Gonzaga; Ao Oeste Bom Lugar; A Leste São Mateus e Alto Alegre.
    Situação Demográfica
  Bacabal, até a década de 1970, apresentou extraordinário surto demográfico especialmente nas décadas de 1950 e 1960. Em 1950, segundo o recenseamento, a população do município era de 54.949 habitantes. De acordo com o censo de 2000, a população se compunha de 91.823 pessoas habitantes, sendo 44.052 homens e 47.771 mulheres. Deste total de habitantes, 71.408 residem na zona urbana e 20.415 na zona rural. Em 2002, a população estimada de Bacabal era de 93.263 habitantes, apresentava densidade demográfica de 63.74 habitantes por quilometro quadrados, com uma taxa de crescimento de 0,52 por cento ao ano. 
    A descoberta da cidade
   Em 1613 inicia-se a história da ocupação da hoje denominada região do Médio Mearim e tem início ainda ao tempo da Invasão Francesa (1612-1615) quando Daniel de LaTouche, senhor de LaRaverdiére. Em 1613, mandou ao Rio Mearim, em expedição de reconhecimento, quarenta franceses para buscar os índios Tabajaras que estavam a duzentas léguas da Ilha de São Luís. Daniel de LaTouche autorizou ainda mais quatro viagens às cabeceiras desse Rio Mearim. Nessas incursões consegue trazer para a Ilha de Upaon-Açú os aguerridos índios Tupinambás.
    Dos primórdios da fundação de Bacabal
   Data de 1750, por ordem do Rei de Portugal, o Governador Francisco Pedro de Mendonça Gurjão (1751-1757) organizou expedições exploratórias às cabeceiras do rio Mearim. Estas expedições foram acompanhadas por padres jesuítas. Já no Século XIX e no início século XX, a nação Timbira, que habitava as campinas do sul do Maranhão teve seu território invadido por sertanejos nordestinos que, com seus rebanhos bovinos, apossaram-se das áreas de pastagem nativas de frente interior apropriadas para a criação de gado. Diante da expropriação de seus territórios os índios passaram a viver sem lugar fixo, mas onde quer que se instalavam, logo seus perseguidores vinham em seu encalço. 
  Os Timbiras, expropriados de suas terras passaram a trazer insegurança e transtorno para os colonizadores, que aqui já se encontravam vivendo da lavoura do algodão, milho, arroz, mandioca e mamona, em terras que antes, eram suas. 
    O historiador Neto (1980), relata que a história de Bacabal inicia-se no século XIX, antes de 1830, com a "instalação de uma colônia indígena chamada "Colônia Leopoldina" que mais tarde se tornaria uma próspera fazenda agrícola de produção". Os nativos da região, os que habitavam nos povoados Boa Vista da Tábua e Aldeia do índio, não deixaram de esboçar resistência. 
      Nasce o povoado de Bacabal
    Em 1839 instala-se às margens do Mearim o Senhor José Machado, iniciando-se um povoado que seria conhecido como “Localidade Machado”, depois “Vila Velha”, hoje, São Luís Gonzaga. Entre uma e outra denominação, chamou-se “Ipixuna”. João Machado foi quem fundou o primeiro porto de navegação da cidade, denominado popularmente de “Porto do Machado”. Esse ano é dado como o da fundação da Freguesia (hoje) de São Luís Gonzaga, da qual o povoado de Bacabal fazia parte, segundo distrito Policial. Neste ano, pela Lei no. 85, de 02 de julho, o Governador Manoel Felisberto de Sousa e Melo criou três “Missões” ou aldeias indígenas. Existiam bem próximo à Vila Velha do Machado, algumas tribos indígenas: Carauzés, Pobeges, e Timbiras, e uma colônia de silvícolas - a Colônia Leopoldina – situado no povoado Matão, próximo à paragem Bacabal.
     Nasce a Vila de Bacabal
   1854: o presidente da Província, Eduardo Olímpio Machado, delibera sobre a situação dos índios Timbiras que deixavam as cabeceiras dos rios Mearim e Grajaú e se arriscavam nas fazendas localizadas nas margens desses rios. Nomeia para diretor da Colônia Leopoldina uma pessoa de sua inteira confiança que era o subdelegado do distrito de Bacabal, Lourenço Vieira, depois condecorado como coronel da Guarda Nacional que mais tarde tornara-se fundador da Vila de Bacabal. A instalação da Colônia Leopoldina, localizada nas proximidades do distrito de Bacabal, ocorreu no governo Olímpio Machado, e em função de atos hostis praticados pelos indígenas na fazenda do tenente-coronel José Caetano Vaz Júnior. Este fato está descrito em “A habitação dos Timbiras”, do indigenista Curt Nimeundaju (alemão, com adoção de nome indígena), publicado em 1944 e que identificavam os Timbira Orientais do norte vivendo nos cursos inferiores dos rios Mearim e Pindaré. No Mearim, eram os Krenyê de Bacabal (núcleo urbano junto ao qual eram habitantes), os Kukoikateyê e, possivelmente, os “Pobzé”. 1857 A Colônia Leopoldina, regida pelo Regulamento Provincial de 11 de abril de 1854, destinada ao aldeamento de índios Crenzés (Carauzés) e Pobés (Pobeges), foi dirigida pelo padre alemão Carlos Winkler. Em um seu relatório, esse padre afirmava que a colonização dos índios, como vinha sendo feita, causava muitos prejuízos. Propôs a sua substituição pela colonização estrangeira.

Em 1867 surge relatos na Vila de Bacabal que indicavam a existência de 671 índios no alto Mearim (hoje, Médio Mearim). 1876  Registro da primeira ação de povoamento de Bacabal, iniciada pelo coronel Lourenço Antônio da Silva, depois consolidada por outro coronel, de nome Raimundo Alves de Abreu. O coronel Lourenço Antônio da Silva, oriundo de Portugal, fundou uma fazenda às margens do Rio Mearim, onde hoje é a Praça de Nossa Senhora da Conceição, para o cultivo do algodão, arroz e mandioca. Lourenço da Silva também trouxe para o local seu irmão João Lázaro da Silva, que se instalou na localidade, precisamente na área compreendida pelo atual Bairro Juçaral.

No período de 1876-1878 o historiador Neto, narra que até 1876, as tribos dos Guajajaras e Crentes, essa última de origem desconhecida, habitavam a região do médio Mearim, exatamente na região onde está localizada Bacabal. Suas malocas situavam-se onde hoje é o atual bairro do Juçaral.
A existência belos rios e lagos fartos em águas límpidas e muito peixe, em uma vasta região de planície caracteriza pela riquíssima flora e fauna fizeram brotar as primeiras vias de acesso que possibilitou a chegada do Coronel português Lourenço da Silva em 1876, naquela região encontrou o ambiente ideal, propício para a instalação de sua fazenda, destinada ao cultivo da mandioca, feijão, milho, mandioca e algodão. Onde hoje é a atual praça Santa Terezinha, antes denominada Praça de Nossa Senhora da Conceição, situava-se a fazendo a fazenda que deu origem a cidade.

No ano de 1877 ocorreu uma grande seca que provocou uma alta corrente migratória de povos de toda região Nordeste em direção ao Estado do Maranhão, cujo fluxo maior se dirigiram à região do Alto Mearim. Para atender esse forte fluxo migratório, em 1878 foi criada a Colônia Flores, às margens do Mearim, na confluência do Rio Flores. Outras localidades beneficiaram-se daquele movimento migratório, além de Pedreiras. Bacabal recebeu centenas de famílias que se estabeleceram às margens do Mearim, iniciando um processo de natural de colonização.

Já em 1882 o Diretor-Geral dos Índios da Província do Maranhão, Trajano A. Valente, informou que a Colônia Leopoldina contava com 226 índios, que plantavam algodão, arroz, milho e mandioca, fazendo seu próprio custeio. Nesse período a Colônia era dirigida por Raimundo Alves de Abreu, pai do Coronel Manoel Alves de Abreu.

As consequências da Lei Áurea assinada pela princesa Isabel impactou fortemente o empreendimento que era a fazenda do Coronel Lourenço da Silva, fazendo-o entra em decadência, uma vez que a mão de obra que tocava a fazenda era do tipo negra e escrava e auxiliada pelo trabalho subserviente dos indígenas. Desse modo a fazenda foi vendida ao também português, o Coronel Raimundo Alves de Abreu que, habilidoso, passou a produzir pelo braço da "mão de obra livre", passando a ser conhecida como "Sítio dos Abreus".

O ano de 1888 marca, portanto, a abolição da escravatura. Ano em que houve o declínio das fazendas da região ocasionando o repasse para outros proprietários. Nesta ocasião destacou-se o também fazendeiro, de origem portuguesa, coronel Raimundo Alves de Abreu, pai do coronel Manoel Alves de Abreu e do fazendeiro Francisco Alves de Abreu, que através do denominada fazenda situada no “Sítio dos Abreus”, ousou produzir com mão de obra livre, logrou êxito e prosperidade nos negócios da fazenda, período em que inicia-se a atração de pessoas para a região, principalmente do Nordeste, devido à seca que então se agravava. Essa migração contribuiu muito para o desenvolvimento agrícola. O Coronel. Raimundo Alves passa a comercializar com esses trabalhadores livres e com os índios, com suas malocas que ficavam situadas na altura do bairro do hoje Juçaral.

O ano de 1895 trás em seu histórico o florescimento do comércio de Bacabal, que atraiu imigrantes e estes, com seu trabalho, fizeram desenvolver a produção na fazenda "Sítio dos Abreus". Houve, dessa forma, o aumento populacional que provocou a necessidade de rápida ligação entre o povoado, que então exponencialmente se formava e a Capital São Luís. O fato enche os olhos das autoridades da época que, entusiasmadas, com as benesses econômicas, buscam na tecnologia o suporte ideal para corroborar com o crescimento. Assim, inaugurando-se um Posto do Telégrafo Nacional, na sede da fazenda, Sitio dos Abreus, em 1895.

O primeiro ano da primeira década, ou seja o ano de 1901, no governo estadual de João Gualberto Torreão da Costa, foi autorizada em acordo com a Diretoria Geral dos Telégrafos a construção de uma linha telegráfica partindo de Bacabal, margeando o Rio Mearim, até Barra do Corda.

Em 1913, Bacabal passa a ser estratégico para o Maranhão, pois aqui foram criadas as Coletorias Federal e Estadual.

Em 1916, ainda vinculado a São Luís Gonzaga, o Intendente do Município Francisco de Abreu, conhecido pela alcunha de "Chico Abreu", trouxe do povoado Urubu ou Mata-Fome, do distrito de Bacabal, seu irmão mais moço, chamado Manoel Alves de Abreu, que ali vivia de pequeno comércio, para auxiliá-lo em seus negócios particulares. Manoel Abreu cresce politicamente, vindo a dominar a região por mais de três décadas.

Dados histórico confirmam que em 1920 Bacabal é elevada à categoria de Vila, através da Lei Estadual de número 932, de 17 de abril, assinada pelo então governador do Estado Urbano Santos Costa Araújo, passando a se chamar de "Bacabal dos Abreus", gozando de ter, a partir daquele momento, seu território desmembrado do distrito de São Luiz Gonzaga. A instalação oficial do Município de Bacabal ocorreu poucos meses depois, em 07 de setembro de 1920, como já citado, com o seu território demarcado e desmembrado do município que era sede, São Luís Gonzaga, naqueles idos denominado de "Ipixuna".

Naquele período histórico, Bacabal apresentava, em termos demográficos, cerca de 9.500 habitantes em todo seu vasto território. Desde a sua fundação em município-distrito, sofreu vários desmembramentos.  Em 1961, para formação dos municípios de Lago Verde (Lei nº 2.157, de 30 de novembro), Olho d’Água das Cunhãs (Lei nº 2.158, de 30 de novembro), e São Mateus do Maranhão (Lei nº 2.170, de 26 de dezembro). 

Entre o final da década de 1930 até a década de 1960, constituiu-se a fase áurea da economia regional de Bacabal. O carro chefe foi uma indústria francesa, estabelecida na cidade vizinha de São Luís Gonzaga, que se dedicava à compra e venda de algodão, exportado através da hidrovia do Rio Mearim. Em razão da Segunda Guerra Mundial, o Cotoniére Brasil Cia Ltda. foi vendida para a empresa brasileira Chames Aboud e Companhia, de propriedade de Wady Aboud e seus filhos César e Alberto Aboud. Em função desse movimento, Bacabal torna-se centro comercial e de produção, com um porto de muito movimento, atraindo muitos migrantes nordestinos. A firma dos Aboud possuía filial em Bacabal. 

Em 1931 é inaugurada a iluminação elétrica, com sua primeira usina substituída por outra mais possante, estando atualmente, sob responsabilidade das Centrais Elétricas do Maranhão - CEMAR.

No ano de 1938 a Vila de Bacabal é elevada à categoria de Cidade pelo Decreto-Lei número 159, de 06 de dezembro de 1938.

Endossa o historiador Neto (1980), supra citado, que até o final da década de 40, os índios passavam sempre por Bacabal ao viajarem para São Luís, através de embarcações, para visitar o "Pai Grande", que era a forma como tratavam o Governador do Estado do Maranhão. Portanto, até a década de 1940, antes da construção da estrada BR 135 e 316, a viagem de Bacabal para São Luís, capital do Estado, era feita basicamente de lancha e durava em média uma semana. Em 1945, Alceu Pedreiras Martins, por indicação do Interventor Estadual Paulo Ramos, é nomeado Interventor Municipal em Bacabal. 

Em 1966, um dos candidatos a Prefeito de São Luís Gonzaga, de nome Bete Lago, teve impugnada a sua candidatura por residir em Bacabal. 

Aspectos relacionados a saúde: Quanto à saúde pública, existiu em Bacabal o hospital Santa Terezinha, com especialistas e clínicos gerais. Chegou a possuir 40 leitos, e estava instalado em prédio especialmente construído para esse fim. A população conta, ainda, com três postos de saúde, sendo um deles de propriedade da Paróquia de São Francisco, inaugurada em junho de 1970. 
Já na década de 1970 o Município dispunha de cinco médicos, quatro dentistas, cinco farmacêuticos e 12 enfermeiros. Havia, nesse mesmo período cerca de 20 farmácias e drogarias em funcionamento.

Aspecto religioso: Na cidade o culto católico, até aproximadamente os anos 80, era praticado em 13 templos entre os quais a Catedral de Santa Terezinha, matriz de São Francisco das Chagas, cuja paróquia tem jurisdição sobre as capelas das cidades de Santa Inês, Olho D’Água da Cunhãs e Lago Verde, Igreja de Sant’Ana e 15 capelas. Entre as igrejas protestantes citavam-se a Batista que foi Pioneira, a Adventista do 7º Dia e a Assembleias de Deus.

Referências Bibliográficas:

DACOSTA, Lamartine. (ORG.). Atlas do Esporte no Brasil.  Rio de Janeiro: CONFEF, 2006.
MONTEIRO, Raimundo Flor. As contribuições da Trizidela para Cidade de Bacabal. 2013

Observações:

Pedagogo (UEMA). Mestre em Educação (UFMA). Especialista em Gestão de Recursos Humanos (UCAM). Engenheiro Mecânico Industrial (IFMA). Especialista em Historiografia Brasileira (IGUAÇU). Foi Instrutor de Ajustagem Mecânica, Tornearia Mecânica e Higiene e Segurança no Trabalho no SENAI-MA, no período de 1976 a 1989. Foi Coordenador Pedagógico do SENAI- Bacabal/MA, no período de 1980 a 1996, quando foi transferido para o SENAI/DR/MA em São Luís, onde ocupou os cargos de Supervisor Pedagógico, Gerente de Educação e Assessor Técnico da Direção Regional no período de 2007 a 2016. Período em que foi também membro do Comitê Técnico Nacional do SENAI/DN.

quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

DE "EDUCAÇÃO PARA A RESPONSABILIZAÇÃO INDIVIDUAL PARA EDUCAÇÃO E CONSCIÊNCIA DE CLASSE"

RESENHA: DE "EDUCAÇÃO PARA A RESPONSABILIZAÇÃO INDIVIDUAL PARA EDUCAÇÃO E CONSCIÊNCIA DE CLASSE".
Resenha do último artigo do livro "Educação e luta de classe". 1a ed. São Paulo: Expressão Popular, 2008. 144p, cuja autora é Angela Maria Hidalgo.Resenhado por Raimundo Flor Monteiro, em 02/12/2019, Mestre em Educação, formado pela UFMA - Universidade Federal do Maranhão.
O assunto é tratado sob a perspectiva crítico-progressista. A autora inicia o artigo afirmando que no conceito de "educação permanente" enquanto prerrogativa proposta pela UNESCO, afirma-se o pressuposto de que educação e consciência das responsabilidades individuais pode resolver todos os problemas sociais. Autora enfatiza que "educação permanente", exponencialmente difundida, atribui "poderes desmedidos a educação" ao mesmo tempo que esvazia os processos educativos e a própria educação formal. Desse modo, a autora afirma que a educação formal perde sua especificidade frente a ações sociais de caráter educativo.
O fato para ela, a autora, acontece dado que os teóricos da ONU aproximam a educação formal da educação informal, através de alteração no conteúdo da primeira, incluindo autoestima, heterogeneidades sociocultural, o entorno social da escola e a busca de aliados para a superação do atual insucesso escolar. A autora reconhece o potencial das práticas educativas para as transformações sociais, porém ressalta que não é a unica. Afirma que as exigências sobrecarregam a escola fazendo-a perder sua especificidade. A autora chama de "falácia" a ideia de que a educação é eficiente em resolver todos os problemas sociais, em especial, se tiver a participação de todos os setores da sociedade, uma condição que somente a educação concatenada com outras dimensões sociais pode resolver.
A autora defende o investimento público maciço pelo Estado em educação e demais campos do social. Reafirma que no momento histórico de restruturação do capital, o financiamento estatal priorizam a expansão econômica em detrimento do social. Assim, o Banco Mundial e a Unesco, hoje, orientam para a captação de investimentos que subsidiam a transferência das responsabilidades da educação para a esfera da sociedade civil. A autora cita um Caderno da Unesco Brasil em que o autor demonstra o "círculo perverso" da pobreza e defende a articulação das políticas econômicas e social, para que haja crescimento econômico e consequente redução das tensões sociais.
Deduz a autora que o "investimento no capital social" é necessário, para estabelecer o clima de confiança dos sujeitos, motivar o interesse nas questões coletivas e despertar a consciência cívica, bem como a promoção de políticas sociais e a minimização das desigualdades e da pobreza, bem como a emersão de um novo Estado. Este, o Estado liberal, estaria responsável apenas pela "gestão das políticas "na linha da "gerência social" e "gerencia interorganizacional", em que cada setor da sociedade assume responsabilidades, incluindo ONGs, igrejas, universidades, empresas, sindicatos e voluntariado. Enfim, minimizado a ação e a responsabilidade institucional do Estado.
A partir da página 130 a autora passa a enumerar os parâmetros utilizados de "intervenção societal " pelo Estado na execução do novo papel neoliberal:
a) Esvaziamento da função educativa da escola, através da superestimação do papel da escola, ao atribuir-lhe múltiplas funções e inúmeras responsabilidades, que são desenvolvidas através da centralidade nos projetos sociais. Os projetos executados por ONGs servem de parâmetros para atender ao mercado, bem como de base para regulação social pretendida pelo Estado. O Estado, ante a sociedade civil, afirma como "sujeitos" do processo de implementação de políticas sociais, as ONGs, empresas, as diversas associações, etc. Sobre esse fato Montaño (2002) afirma que o Estado promove o esvaziamento e transfere para os agentes da sociedade civil, já citados, as ações de conceber e executar as politicas públicas de sua alçada.
b) Atuação escolar com base no associativismo (voluntariado) para atuarem em causas pontuais, a medida que nega a atuação sindical; Cita (Enguita, 2007), ao afirmar que o acesso a informação, dentro da nova sociedade do conhecimento, como elemento socialmente segregador, que implica flexibilização curricular, definição do planos de estudos, inserção dos pais e das comunidades para maior ascensão cultural. (a autora não se declara contra inserção dos pais e das comunidades na escola).
Para afirmar "a relação entre educação e consciência de classe" a autora reafirma que: 1. Submeter a centralidade dos "processos materiais de produção", subordinado aos fundamentos da "produção das relações sociais" da existência humana.
2. Assunção do trabalho como definidor da essência humana, dado que ao agir sobre a natureza, ao alterar o meio físico, ao produzir artefatos e instrumentos de trabalho, ao realizar no âmbito social objetivações, que resultam em novas necessidades, que incorporadas subjetivamente, passam a historicamente a fazerem parte do seu ser social.
3. Vai buscar em Márkus, 1974; Duarte 2000, a afirmativa de que somos seres humanos quando incorporamos um modo de vida material, cultural e social, forjado num processo de criação e recriação de formas de produção material e simbólica de nossa existência social.
4. As crises peculiares e constantes do modo de produção capitalista são resolvidas temporariamente por "novos arranjos produtivos", permanecendo assim a hegemonia de classe;
5. As alterações no modo de regulação social vigente advém da passagem do modo de produção taylorista-fordista, para o regime de produção flexível. O primeiro exigia do sistema educativo a formação em diferentes níveis de ensino e grau de conhecimento, pré-estabelecidos; ao segundo, as novas configurações do mercado passam a exigir a formação de um trabalhador polivalente em diferentes atribuições, capaz de elevar a produção com um reduzido número de trabalhadores, visto que a terceirização, junto a contratadas, promovem a subcontratação sem garantia de direitos, produzindo alta instabilidade, baixos salários (em função da alta rotatividade da demanda por novos produtos). Essa nova escola neoliberal terá que desenvolver competências e habilidades - competência para aprender, para fazer, enfim que lhes permita viver num mundo instável em que direitos é obstáculo para o desenvolvimento das empresas.
6. Esclarece que o comprometimento das agencias internacionais com o modo de produção capitalista, demanda do sistema de ensino as necessidades impostas pelo mercado de trabalho. O discurso humanista é pura retórica para amenizar a miséria e melhor conter as tensões sociais, via atribuição de responsabilidade a sociedade civil.
7. Defende, para um futuro contexto onde haja consciência de classe a defesa de uma educação politécnica que preconize o amplo desenvolvimento das forças produtivas, de avanço tecnológico. Uma educação humana e libertária que supere as contradições centrais do modo de produção capitalista e que contribua com o processo global de transformação societal, preservando a educação formal e o caráter do ensino e do conhecimento científico-filosófico.
8. Imprescindível, diz a autora, destacando o papel do sindicato de trabalhadores da educação na busca de melhorias para a categoria, e no campo de correlação de forças, bem como do seu papel educativo na perspectiva de educação permanente, voltada aos interesses amplos da sociedade, na medida que educação e promove espaços de formação continuada da categoria.
9. Reitera a defesa de uma concepção pedagógica de educação que reconheça os processos de produção da existência humana, na dialética entre objetivação e subjetivação, em que os conceitos e classificação dos fenômenos naturais e sociais, sejam expressos em uma lógica-dialética em detrimento da aparente organização lógico-formal instrumental.
10. A adoção de um trabalho pedagógico ministrado pela lógica dialética que evidencie o papel social da escola, as atualizações históricas da humanidade, inclusão de aspectos políticos e culturais, explicitação dos embates de diferentes interesses socioeconômicos e culturais.
11. Uma pedagogia histórico-crítica, a exemplo de Saviani (1980) e Gasparin (2002), com um corpus teórico e metodológico que preserve a educação formal, priorize o trabalho, os conhecimento da área e saberes de imediato necessários aos alunos; uma base curricular que aborde os conhecimentos científicos escolares x saberes de senso comum dos alunos, através dos passos: problematização, instrumentalização e a cartase; um currículo escolar de regulação nacional e estadual definidos em fóruns coletivos de educadores.
12. Defende uma ação democrática da escola com forte vínculo com o entorno, com espaços de formação política, via participações em que haja expressão das necessidades e expectativas das pessoas; inserção de profissionais da educação com domínio dos conteúdos, capacidades política, aberto ao confronto.
Se pôde extrair da obra que:
A globalização e a financeirização do capital acirram a competição e as demandas por acumulação. O antigo modo de produção tornou-se insustentável, a medida que subsidiou a garantia o bem-estar social do trabalhador em detrimento da menor acumulação do capital.
A educação para a responsabilização individual é uma estratégia do capital para esvaziar a educação e desvirtuar e obstacularizar uma nova consciência de classe". A educação, para o capital, passa a ser a base para a desconstrução do atual modo de produção fordista e a nova base para instalação do modelo de produção flexível.
A denuncia do equívoco da colocação da "educação" como único constructo social, capaz de resolver todos os problemas na atual e complexa sociedade contemporânea. Portanto, o pseudo humanismo é um fator de condicionamento dessa inculcação e consequente condicionamento, que redunda em obstáculo que impossibilita uma consciência de classe.
A educação escola formal se esvazia mediante a incorporação de múltiplos problemas de outras instâncias, que tangenciam a educação, mais que não estão diretamente ligada a sua alçada.
Há uma prática de desconstrução da estrutura escolar atual, que visa isentar o Estado da obrigação constitucional de gerir a educação para todos. Tal processo, consiste em entregar a gestão da educação para os seus beneficiados, representados por associações e ONGs, além de obter o seu financiamento através das empresas, conjugado com trabalho intermitente de voluntários. Dessa forma, a educação escolar formal passaria a funcionar completamente voltada para suprir as demandas do capital.
Questões teórico práticas que se levantam sobre a obra lida?
1. A educação enquanto campo de atuação social para o novo modo de produção flexível, trás em sua gênese as estratégias de desconstrução e desarticulação do modo de produção anterior. Por conseguinte, quais seria as diversas táticas sociais e estruturais de combate ao novo, predatório aos direitos sociais?
2. Até que ponto o protagonismo das ONGs a serviço do capital e as associações que ora assumem o papel do Estado como executoras da educação nesse novo contexto sócio-produtivo se afastam do social?
3. A amplitude da pedagógica das competências as concebe como a capacidade de mobilizar conhecimentos, habilidades e atitudes, para equacionar, adequar e resolver situação complexas. Assim, como se estrutura esta pedagogia, na teoria e na prática, para atender ao novos reclames do novo modo de reestruturação produtiva?
Quais são as aplicações práticas que a leitura poderá possibilitar?
a) Nos permite enxergar no espaço e no tempo, o elevado grau de nossa ingenuidade social diante de uma realidade complexa, na qual estamos submetidos ao controle social e o quanto já incorporamos as teses deterministas econômicas neoliberais em nosso contexto atual. Portanto, hora de fazermos um marco situacional individual e projetarmos, sair da zona de conforto para uma ação e posterior consolidação de um novo ativismo na defesa da democracia, justiça social e anti teses liberais.
b) Qual o público indicado para leitura? Todos os cidadãos e cidadãs que estiverem dispostos a crescerem pessoal e profissionalmente, independente de cor, escolaridade, raça e credo.
c) Conclusão do autor?
A autora procede uma análise acurada dos processos de isenção (isentar) que culminam na desobrigação do Estado para com o social, no que tange a Educação Formal. Faz isso através da desconstrução de sólidas políticas anteriormente implantas e via a implantação de novas políticas neoliberais, que se processa sob a orientação dos órgãos multilaterais (Banco mundial, ONU, etc). Um dos objetivos principais é conseguir, através do esvaziamento do papel da educação formal, isentar o Estado do seu papel de principal protagonista, colocando em seus lugar ONGs e instituições que operam com recursos privados. As consequências dessas orientações pseudo humanísticas tem relação com a alienação do cidadão, que os faz perder a sua consciência de classe. O equivoco neoliberal identificado pela autora, é que os pressupostos neoliberais superestimam a educação formal, o que o torna uma miragem ou mesmo uma panaceia. E pior, passa a defender uma escola financiada com recursos públicos, além do esvaziamento curricular e foco direcionado nas necessidades do mercado, fazendo com que a gestão escolar esteja apenas voltada para as necessidades do sistema produtivo em detrimento das graves questões sociais.

R
AIMUNDO FLOR MONTEIRO
MESTRE EM EDUCAÇÃO
UFMA - UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

Referências:
Educação e luta de classes/Paulino José Orso, Sebastião Rodrigues Gonçalves, Valci Maria Mattos (organizadores) - - 1. ed. - -  São Paulo  : Expressão popular, 2008. 144p  :il.